Eram milhões de balões e, como todos os balões, no começo, eles não passavam de um plástico sem graça, sem vida, irrisórios. Esses eram ainda mais bobinhos: não tinham cor. Que balões eram esses, totalmente desprovidos de alegria? Esperavam pela magia. Quando viria ela preencher-lhes com o sopro da vida?
Os homens, que, ao contrário dos plásticos, tinham alma, encontraram-nos. Não sabiam que eram balões, claro, porque balões ainda nem existiam, mas sentiram despertar dentro de si uma curiosidade irreverente sobre aquilo que viam. Queriam criar e inovar, usar da feitiçaria do conhecimento para construir um sentimento puro que faria voarem aqueles materiaizinhos estranhos.
Contudo, eram humanos e humanos têm, em seu coração, medo. Um medo sufocante do novo; um terror ácido que corrói a vontade e a curiosidade; umas brumas densas de temor que envolvem o coração e cegam a visão; um horror que inutiliza o cérebro.
Não tiveram os homens ao menos a chance de ter um motivo pelo qual amedrontarem-se. Afinal, não puderam dar cor e ver as cores flutuando. Não puderam sentir a emoção de fazer o plástico virar balão – e, depois, o balão virar alegria. Pelo medo de perder o que vinha pela frente, perderam sentimentos tão singulares.
Perderam o céu azul salpicado de pontinhos coloridos. Perderam o contraste do plástico rosa, amarelo, laranja e verde nas nuvens de um branco tão puro. Perderam os raios solares fazendo com que as cores se acendessem ainda mais – e fazendo ascender dentro dos corações essa alegria que transborda do corpo e da alma. O medo estagnou o sentimento do mesmo jeito que vive estagnando as pessoas, suas vidas e suas ações. O medo que veio antes do próprio medo foi o mal dos homens, nessa história e em todas as outras, que não puderam dar vasão à sua criatividade e curiosidade.
No fim das contas, o ser humano não precisa ter por que temer – ele sempre arruma um motivo. Porque não ter medo amedronta mais do que tê-lo. Ninguém percebe que o pior medo é o medo de ter medo. Ninguém percebe quão inúteis são todos esses temores e quão mais simples seria nossa vida sem eles.
Sobre balões e medos
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